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RESCISÃO CONTRATUAL DO EMPREGADO POR MÚTUO ACORDO E O COMPLIANCE TRABALHISTA

  • Foto do escritor: Lucio Mesquita
    Lucio Mesquita
  • 29 de set. de 2021
  • 4 min de leitura

Tida como uma das alterações da Reforma Trabalhista, promovida pela Lei n. 13.467/2017, destinada a regularizar uma irregularidade muito comum, a rescisão contratual por acordo visa resolver o impasse provocado pelo empregado que pretende ver rescindido o contrato de trabalho, mas também não aceita pedir demissão. Neste caso, frequentemente eram feitos acordos para simulação de um aviso prévio trabalhado retroativo, bem como acordada a restituição da multa de 40%.

Ao pedir demissão, o empregado tem como consequência a “perda” da multa de 40%, do aviso prévio indenizado, não pode sacar o saldo do FGTS e não tem direito ao seguro-desemprego. Coloco “perda” entre aspas, pois o direito a estes benefícios somente existe quando o contrato de trabalho é rescindido por iniciativa do empregador. Em outras palavras, se há demissão por iniciativa do empregador, o empregado “tem” o direito. Se não é o empregador que quer demitir, este direito não existe. Ou seja, o empregado que pede demissão não “perde” o direito, pois o direito não existe ainda, ele é condicionado a um fato que não ocorreu. Ora, é um fato comum e muito real a atitude de vários empregados que tentam forçar sua demissão. Não creio que existam trabalhos científicos, com dados estatísticos sobre a ocorrência desta conduta. Confesso que não pesquisei, mas acredito que seja muito improvável a existência de tal estatística, inclusive por ser esse tipo de pesquisa contrário ao politicamente correto da teoria do direito do trabalho. Mas em quase trinta anos de convívio com o Direito do Trabalho, asseguro que é extremamente comum a tentativa do empregado em ser demitido, quando, na verdade, é seu o desejo de rescindir o contrato. O artigo 484-A da CLT tem por objetivo regularizar esta situação, ao permitir a rescisão contratual por acordo. Neste caso, são devidos pela metade o aviso prévio indenizado e a indenização sobre o saldo do FGTS (multa de 40%), permitindo o saque de 80% do saldo do FGTS, não tendo o empregado o direito ao ingresso no Programa do Seguro-Desemprego. Para o empregador individual ou uma pequena empresa, esta situação, talvez não demande qualquer providência mais complexa. Se presente a intensão do empregado para fazer um acordo, este é feito por escrito e corre-se o risco, ponto final. Entretanto, para as grandes companhias, devidamente estruturadas, com milhares de empregados, planos complexos de cargos e salários, vários níveis de hierarquia, surge um problema de compliance. O compliance parece ser uma coisa simples, significa estar em conformidade com a legislação, ou seja, cumprir a lei. Entretanto, esta situação de conformidade depende, nas companhias, da declaração em códigos de ética, esquemas de cumprimento das normas (frameworks), modelos de negócios, instruções internas, treinamentos etc. Não basta dizer que se pretende cumprir a lei, mas é necessário fazer tal declaração a todos os envolvidos, existir o cumprimento e fiscalizar. Assim, surge um desafio sobre o acordo para rescisão previsto no artigo 484-A da CLT. Como orientar encarregados do RH, líderes, supervisores, gerentes sobre as exigências e situações em que o acordo possa ser feito? O acordo previsto no artigo 484-A da CLT pode desafiar a reputação da companhia, pois podem os empregados alegar que foram forçados a aceitar o acordo, sob o argumento de que nada receberiam se não fosse assinado ou que foram forçados por algum superior autoritário, através de assédio moral. A empresa ainda pode se deparar com juízes do trabalho mais protecionistas, que entendem, diante do presumido vício de consentimento do empregado, que tal acordo não é válido. Entendo, entretanto, pela real utilidade do artigo 484-A da CLT, diante do comum conflito, gerado pelo empregado insatisfeito, que não mais quer manter o contrato de trabalho, mas não quer pedir demissão, pois, conforme dito acima, não quer ‘perder’ direitos. Neste caso, entendo que deve ser elaborado um programa de entrevista e aprovação, onde a rescisão pelo acordo será tratada como uma situação excepcional. O empregado deve declarar o motivo do seu interesse em deixar o emprego, manifestar todo o seu descontentamento bem como dizer se já tem emprego, expectativa de recolocação profissional ou se pretende mudar de atividade econômica. Além disto, recomento que o empregado seja advertido que deverá aguardar a análise e a aprovação pela empresa sobre o interesse em também rescindir o seu contrato e a possibilidade de sua substituição no posto de trabalho por outro candidato. Após um período razoável, que pode ser de uma ou mais semanas, para avaliação do interesse da empresa e para que o empregado reflita, recomendo ainda que o empregado ratifique seu pedido de acordo expressamente e declare que foi devidamente instruído sobre as consequências. Importante sempre lembrar que a rescisão por acordo não pode ser utilizada como simples alternativa econômica para redução dos custos quanto às demissões. Em caso de questionamento pelo empregado, uma das provas valiosas sobre a validade da rescisão por acordo é a comprovação de quantas demissões sem justa causa ocorreram no mesmo período, com pagamento da integralidade das verbas rescisórias.


Lucio Mesquita - OAB/SP 138.294 Graduado pela USP, com especialização nas áreas de Direito do Trabalho, Compliance, Processo Civil e Privacidade de Dados.

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