RESTRIÇÕES AOS NÃO VACINADOS EM CONDOMÍNIOS
- Lucio Mesquita
- 13 de out. de 2021
- 4 min de leitura
Atualizado: 9 de mai. de 2022

É importante lembrar que mesmo a vacinação não resolve o problema da contaminação pela COVID, mas é irrefutável a proteção ao vacinado com relação às suas consequências e a redução de sua contaminação. A vacinação protege não somente o vacinado, mas evita que ele contamine outros.
Desta forma, diversos países, além do Brasil vêm adotando restrições para as pessoas não vacinadas, exigindo a comprovação da vacinação para ingresso em seu território. Localmente, o Decreto Municipal nº 60.488, de 27 de agosto de 2021, da Prefeitura Municipal de São Paulo, exige a comprovação da vacinação contra Covid-19, para ingresso em eventos com público superior a 500 pessoas, sob pena de aplicação de multa no valor de R$9.232,65. A partir do dia 27 de setembro de 2021, o Tribunal de Justiça de São Paulo, passou a exigir a comprovação da vacinação para ingresso em seus prédios, publicando uma interessante cartilha sobre o tema (1). A Cidade de Guarulhos – SP, passou a exigir a partir de 1º de outubro (Decreto 38.287/2021), a comprovação da vacinação para ingresso em restaurantes, bares, cafés, lanchonetes, academias, museus, cinemas, teatros e shows. O Tribunal Superior do Trabalho tem reafirmado o direito do empregador em exigir a vacinação por parte de seus empregados (2). O Ministério Público do Trabalho também publicou uma orientação sobre a obrigação quanto à vacinação (3). Segundo notícia do Estadão de 28 de setembro de 2021, o passaporte da vacina já era exigido em pelo menos 249 cidades (4). O próprio Supremo Tribunal Federal já afirmou a validade da imposição de medidas restritivas visando obrigar a vacinação (5).
Por sua vez, nos condomínios existem diversas dúvidas a respeito da possibilidade de imposição de restrições pelos síndicos aos moradores que se recusam à vacinação. Qualquer análise deve ser feita mediante a observação de que além do regrado pela convenção coletiva e demais disposições assembleares, também existem normas legais e constitucionais que se aplicam.
O direito à propriedade deve ser observado como garantia constitucional, seja ela como a propriedade da área reservada, como da área comum da qual o condômino também é proprietário de parte ideal. O condômino, além de seu imóvel, também é dono de uma porcentagem do todo. Ou seja, é dono de uma parte de todas as áreas comuns, como o hall de entrada, salão de festas, piscina e bens em geral que adornam estas áreas. Assim, o direito constitucional de propriedade também protege o uso destas áreas comuns. Também pode ser invocado o direito à dignidade humana, que abrange o direito ao convívio e respeito com os demais, desde que não atrapalhe o direito dos demais e não desvirtue a função social do condomínio. Outro princípio que pode ser citado é o princípio da igualdade, desde que respeitadas as diferenças e necessidades humanas de cada um. Por exemplo, eventuais equipamentos podem ser reservados a crianças, pessoas com deficiência, vestiários separados por sexo, vagas para idosos. Evidentemente que a designação de espaços destinados a pessoas com necessidades especiais não viola o direito da igualdade. Também podem ser estipuladas regras para utilização mediante reserva, tendo em vista que os espaços em sua maioria não podem ser ocupados por todos.
Entretanto, as áreas comuns do condomínio devem ser sempre utilizadas em respeito ao direito dos demais condôminos e regras estabelecidas internamente para o respeito à destinação e correta utilização dos bens comuns com segurança.
A convenção coletiva, enquanto pacto celebrado pelos condôminos, é específica para cada condomínio, sendo evidente sua diferenciação, podendo ser alterada e complementada pelas decisões tomadas em assembleia. Assim, ao passar do tempo, respeitado o quórum diferenciado de 2/3, a convenção coletiva pode ser alterada de acordo com a necessidade dos condomínios, adaptando-se a sua realidade. De acordo com as alterações promovidas nas convenções de condomínio, vai-se revelando a especificidade do condomínio, com suas características, como uma liberdade maior de uso ou regras mais restritivas. Quando se compra uma unidade de condomínio, há uma adesão às normas que regem o condomínio, independentemente de se conhecer ou não as normas que regem a vida condominial (Código Civil, artigos 1.333 e seguintes). De qualquer forma, se a convenção condominial contraria normas constitucionais ou legais, haverá um conflito de normas, onde evidentemente prevalecerão as normas superiores. Por esta razão, há de haver uma compatibilização das normas convencionais com os direitos constitucionais dos moradores, como o direito à propriedade, direito à dignidade, à saúde, segurança etc.
Um exemplo recente é o fechamento e abertura de áreas comuns devido a pandemia. O fato de ser uma situação totalmente nova causou grande dúvida sobre como proceder. Houve dificuldades inclusive sobre como fazer as assembleias, criando a necessidade de evolução do sistema para realização na forma virtual, para que se decida sobre o fechamento das áreas comuns durante a pandemia. Recorreu-se às decisões judiciais também, tendo em vista a falta de regulamentação legal.
Considerando que não há previsão em convenção coletiva, por se tratar de questão nova, surge a dúvida sobre a possibilidade de se estabelecer unilateralmente pelo síndico a obrigatoriedade da comprovação da vacinação para utilização das áreas comuns pode gerar questionamentos por violação aos direitos constitucionais de moradia, liberdade de locomoção e igualdade.
Tendo em vista que o síndico tem seus poderes limitados ao razoável e necessário ao cumprimento das normas condominiais, e diante da ausência de lei conferindo poderes ao síndico para exigência do certificado de vacinação para uso das áreas comuns, entendo que é necessária a instauração de assembleia para estipular as regras de acesso, podendo dentre elas ser estipulada a apresentação da carteira de vacinação. Entretanto, sob pena de violação ao direito de propriedade, não pode haver restrição ao uso da área comum essencial ao acesso à unidade, como o estacionamento, as escadas e os elevadores, mas pode ser exigido o uso de máscaras.
Em último caso, pode ser necessário recorrer ao Poder Judiciário para estabelecer regras não previstas em lei, respaldando a restrição para uso das áreas comuns impostas por ato do Síndico, até que se estabeleça em assembleia regras gerais de uso, por exemplo, de áreas coletivas ou de lazer (salões de festa, churrasqueira, piscina, quadras, parques).
Notas:
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